A Diferença entre dizer que é e ser
Enquanto muitos bradam falácias ao vento, nós negros continuamos provando que só faz quem quer!
Nesta primeira semana de janeiro de 2021, o prefeito eleito do Rio de Janeiro Eduardo Paes, em cerimônia de posse na Câmara Municipal da cidade, disse, entre outras coisas, que “fará um governo antirracista” e que ouvirá “todas as vozes de uma cidade tão ampla e tão diversa”. “Montamos um time de secretários jovens e com caras novas. São novos tempos, com novos desafios e precisamos de um governo disruptivo e transformador.”*
Surpresa com a declaração do meu ex fui correndo checar quem eram os(as) secretários(as) que haviam assumido o dever de promover uma temporada de governo antirracista e disruptivo. Pensei: “Será que pela primeira vez teremos uma trupe considerável de secretários (as) negros (as)?” Sim, sou idealista, ingênua e romântica e cheguei a pensar que seria possível, que o prefeito não daria essa declaração assim tão distanciada da realidade do que significa um governo antirracista. Mas, a porrada não demorou muito a chegar! Dos 23 gestores nomeados para assumir as pastas do governo Paes, apenas dois, na verdade, duas mulheres negras, assumem as cadeiras de Políticas e Proteção da Mulher — Joyce Trindade — e Ação Comunitária — Marli Peçanha. Saiba quem são os novos secretários.
Percebam como é fácil se dizer antirracista sem sequer ter que, de fato,
comprovar a veracidade de tal declaração. Como Eduardo Paes pretende
implantar uma gestão antirracista se nem 1\3 de seu secretariado é negro? Como enfrentar a violência do racismo que atravessa tantas pautas interseccionais em um estado onde negros representam 51,7% dos moradores, ou seja, a maioria, segundo o Censo 2010 do IBGE sem buscar
representatividade em cargos extremamente estratégicos como Saúde,
Transporte, Educação e Planejamento Urbano para essa fatia da população que é a mais vilipendiada na corrida social por direitos aos equipamentos públicos? Como garantir uma premissa dessas legitimando um secretariado maciçamente branco para cuidar de uma cidade que contabilizou 1,8 mil* vítimas mortas durante a intervenção de forças policiais no último ano, de cujo total 1,4 mil eram negros, soma de pessoas pretas e pardas**?
Faço essas perguntas agora, que para mim são tão óbvias, mas que deveriam ter sido feitas por Paes lá no início de campanha, no momento de escolher seus companheiros (as) de gestão. Mas, também, como ele ia saber? Ele não é negro! Aí está e sempre estará o X da questão, enquanto não reivindicarmos por representatividade nas instâncias mais cobiçadas pela branquitude. Só há um caminho na busca de equidade racial e esse caminho é a tomada do poder. Lamento profundamente por internalizar a realidade a cada dia que passa de que esse processo não será pacífico e tampouco regido pelo diálogo.
Nas várias manifestações do movimento estadunidense Black Lives Matter em 2020 vimos imagens violentíssimas de policiais apontando armas para crianças negras que acompanhavam seus pais durante os protestos. Entretanto, nesta quarta-feira, 6 de janeiro de 2021 ficamos estarrecidos com as imagens da horda de homens e mulheres brancos de extrema direita, todos incitados pelo enraivecido e desvairado Trump, a invadirem, isso mesmo que você leu, invadirem o intocável — pelo menos era assim conhecido — Congresso Nacional dos EUA em retaliação à vitória de Joe Biden nas últimas eleições presidenciais americanas.
Fica a pergunta: o que nos espera em 2022 caso Bolsonaro não se reeleja
na corrida presidencial? O que esperar da horda branca e, infelizmente,
de alguns negros de extrema direita, inconformados pela não reeleição do
presidente considerado “Corrupto do Ano” por seu papel na promoção do
crime organizado e da corrupção pelo consórcio internacional de
jornalistas investigativos e centros de mídia independente Organized
Crime and Corruption Reporting Project (OCCRP)?
Fé nas folhas, nos Orixás, na espiritualidade e na força de nossa gente
preta!