“Rainha”, de Sabrina Fidalgo

Mulheres negras não deixam o samba nem o cinema morrerem

3 min readJul 29, 2021

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Com as festividades do 25 de julho — Dia da Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha e Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra — me peguei pensando como eu, um homem negro, poderia participar do coro de mulheres que fazem ecoar todos os anos — especialmente nesse, com ênfase nas redes sociais — as conquistas, vitórias e celebrações femininas pela afrodiáspora.

Reconhecendo que muitas vezes aprendemos mais ouvindo do que falando, preferi deixar passar um tempo e retornar às minhas pesquisas para compreender melhor como poderia contribuir no debate dessa data festiva. Quando ensaiava os primeiros passos em minhas pesquisas com os cinemas negros escrevi e apresentei o trabalho “Isso vai dar repercussão — pensando com o samba e o cinema para uma educação contra hegemônica, ali já tracejava os encontros entre duas das minhas preferidas expressões artísticas, culturais e estéticas negras: o cinema e o samba.

Com um breve histórico, evidenciei que as duas artes são mais chegadas uma da outra do que nos parece. Indo muito além das presepadas preconceituosas de tempos de chanchada por sinal. Me desculpe Grande Otelo. Ou até os flertes à esquerda do cinemanovismo, como vemos nos registros históricos dos bambas “ Heitor dos Prazeres” (1965; direção: Antônio Carlos da Fontoura), “Nelson do Cavaquinho” (1969) e Candeia em “Partido Alto” (1976), os dois últimos de Leon Hirszman. Me desculpe se deixei algum nome de fora.

Ainda mesmo com o pioneirismo do ancião Zózimo Bulbul, que desde “Dia de Alforria (?)” (1978), junto ao mestre Aniceto do Império, se dedicou com afinco em suas duas paixões com os filmes: “Pequena África” (2001), “Samba no Trem”(2001) e “República Tiradentes” (2005). Me desculpe também, Zózimo, mas quero aqui destacar mesmo a produção de mulheres nesse dueto entre o cinema e o samba.

“Aquém das Nuvens”, de Renata Martins

A pesquisadora Janaína Oliveira aponta que desde antes do furacão “Kbela” (2015), de Yasmin Thayná, a renovação do cinema negro brasileiro da década de 10 dos anos dois mil passava por mãos femininas. Bato palma para as declarações de Janaína, ainda completando que na parceria cinema e samba tem sido as mulheres negras que têm feito os filmes mais representativos da dobradinha.

Desde “Gurufim na Mangueira” (2000) de Danddara, que narra o até logo do sambista mulherengo e caricato Ivo Meirelles, mulheres negras vêm inovando estas narrativas. Principalmente quando o protagonismo é feminino, como vemos em “Aquém das Nuvens” (2010) de Renata Martins, que conta a história de um casal da velha guarda do samba paulista e os magistrais trabalhos com o carnaval de Sabrina Fidalgo com “Rainha” (2016) e “Alfazema” (2019), se aproximando de outras estéticas cinematográficas para contar histórias e celebrar a existência do samba.

Não poderiam ficar de fora o trabalho da parceira de coluna Aída Barros com o longa-metragem sobre a história de seu pai, Zé Luiz do Império, em “Tempo Ê” (2017). E a referência à maior persona do samba com “Tia Ciata” (2017) de Mariana Campos e Raquel Beatriz. Louvando e celebrando, enfim, a existência ancestral e feminina de ancestrais, presentes ou não em nosso plano, como Conceição Evaristo e Mãe Beata de Iyemonjá.

“Tia Ciata”, de Marina Campos e Raquel Beatriz

Sem fazer mea-culpa agora, torço para que tenha esquecido muitos filmes, pois quero conhecer ainda mais produções nesse estilo. Só agradeço o trabalho dessas incríveis mulheres que vêm nutrindo nossa paixão por cinema e samba. Quem lembrar de mais algum filme, deixe aí nos comentários!

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